A terceira incursão na dramaturgia infantil do SBT, que estreou em agosto, segue seu curso e consolida a retomada da emissora em novelas. No quarto mês de exibição, talvez seja a hora de uma pergunta, tal como Silvio Santos costumava fazer no Qual é a Música?para medir o êxito de algum artista. Afinal: Cúmplices é sucesso, sucessinho ou sucessão?
A audiência da estreia, média de 15 pontos, bateu recorde e foi considerada satisfatória pela direção. Mas a alegria durou pouco, e logo os índices diminuíram para médias que oscilam entre 9 e 10 pontos. A queda foi decorrente do estouro de Os Dez Mandamentos ou por causa da novela em si? Embora a pergunta seja difícil de ser respondida, acredito mais na primeira hipótese, já que a produção da Record é, de fato, um fenômeno.
Quem não gostou nada da pouca repercussão da novela infantil foram os SBTistas, que acham que a história de Manuela e Isabela devia render mais. Mas por quê? A trama de Íris Abravanel não faz feio, e nisso até mesmo os críticos mais ferrenhos concordam, classificando-a como uma evolução no estilo SBT de fazer novela.
Diferente das antecessoras – já que Carrossel era uma narrativa pueril e Chiquititas continha núcleos adolescentes –, Cúmplices tem uma proposta de ampliar o público, com uma premissa de ser uma produção familiar. Com isso me refiro à ênfase de conflitos mais adultos tais como o desaparecimento de Manuela, a rixa entre católicos e protestantes e acontecimentos relativos aos desafios de criar os filhos, como a tramas de Safira e Priscila ou de Flora e seus sobrinhos.
A ausência de produtos licenciados e de patrocínios é apontada como o principal indício de um possível “fracasso” da novela: até agora, nada se viu nas lojas com as personagens de Larissa Manoela, enquantoCarrossel, agora em reprise, volta a dar as caras em bancas de revistas e demais lojas. Sobre esse aspecto, deve-se perguntar qual o potencial efetivo de licenciamento da novela de agora. Se antes os variados mercados voltados para crianças podiam trabalhar nos estereótipos presentes na Escola Mundial e na dicotomia meninos e meninas do Orfanato Raio de Luz, como trabalhar com o universo simbólico das gêmeas, das bandas e dos outros núcleos?
Cúmplices oferece boas alternativas de produtos para crianças ou pré-adolescentes? O que venderia mais: uma bola de plástico com a cara de Manuela ou uma maquiagem de Isabela? Talvez o caminho esteja na segmentação, com investimentos tanto para crianças mais novas quanto para o público teen. Os animais da trama também podem sinalizar uma alternativa eficaz, assim como os emoticons usados nos efeitos gráficos das conversas por celular dariam ótimas figurinhas para o chat do Facebook.
De fato, é de se espantar que até agora o CD não tenha sido lançado, dada a impecável trilha sonora. A promessa é que ela esteja disponível em dezembro, próxima do natal, assim como a boneca, saída clássica para rentabilizar marcas infantis.
Apesar desses impasses, C1R pode ser considerada mais um êxito do canal de Silvio Santos: alcança dois dígitos combatendo com uma novela que tem desbancado até a Globo, aprimora um posicionamento narrativo, contempla um nicho abandonado pela TV aberta e ainda forma público em potencial para o SBT como um todo – daqui uns anos veremos adolescentes rememorando e celebrando o quanto o canal marcou sua infância.
Para comparação, as novelas da Record, salvo exceções, por exemplo, nunca tiveram expressiva repercussão, mas recorrentemente ocupavam o segundo lugar no ranking de audiência e consolidaram atores, autores e um esquema de produção que deu certo por um bom tempo. O mesmo parece estar ocorrendo com o SBT, que em pleno processo de maturação (mais um!), está lentamente se posicionando no mercado.
Há de se ressaltar que diferente das histórias da professora Helena ou das crianças órfãs-cantoras, a trama de Cómplices al Rescate nunca havia sido testada como agora, alçada a principal produto diário da grade e vista como fonte de receitas por licenciamentos. Os dois primeiros remakes já tinham, em essência, tudo para dar certo, e por isso recorreu-se a eles, já conhecidos pelo público e afetivamente ligados a ele. O panorama de audiência das duas exibições da versão mexicana no SBT era outro, e apenas uma modesta boneca da personagem Mariana foi lançada. Não dá para comparar e exigir resultados maiores.
Por ora, a sugestão é relançar a novela após o fim da trama de Moisés na Record e investir na divulgação crossmídia que a Globo faz como ninguém e que o SBT arranhou com Carrossel e Chiquititas. Em um ponto de vista, houve até certa saturação, mas ainda hoje Cirilo, Valéria, Bia e Mosca habitam o imaginário televisivo do SBT, mostrando que a estratégia deu certo – mais de um milhão de pessoas não foram ao cinema para ver Carrossel – O Filme à toa. Que comecem as participações no Passa ou Repassa, entrevistas no The Noite, idas à Eliana e até reportagens no SBT Brasil.
Caberá a Carinha de Anjo, próxima aposta de Silvio Santos, manter o target abocanhado pelo SBT. A história é boa, mais consagrada do que Cúmplices, mas só isso talvez não baste. Será necessário um posicionamento bem forte em relação ao público pretendido e ao potencial de licenciamento e exploração comercial da marca – nem que para isso sejam criadas novas situações e personagens mais “vendáveis”. Os desafios serão ainda maiores com a concorrência das tramas bíblicas e a futura ameaça de Velho Chico. A banda C1R vai finalmente deslanchar e vender CDs e DVDs? A audiência vai aumentar com o fim de Dez Mandamentos? Haverá sucesso de licenciamento? Só as cenas dos próximos capítulos vão dizer.
Por Rafael Fialho* (rafaelbfialho@gmail.com)
*É jornalista mestrando em Comunicação Social pela UFMG e fez do SBT seu objeto de estudo: pesquisa o canal há tempo e atualmente estuda a interação da emissora com seu público a partir da análise das vinhetas institucionais. Atualmente escreve artigos de opinião às quartas-feiras no SBTpedia. Para conhecer seus trabalhos sobre o SBT, mandar críticas, sugestões ou trocar ideias, escreva para rafaelbfialho@gmail.com
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